(O)(A) Cura

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 Escutar a dor humana nos faz mais humanos. Por escuta não falo do simples ato curioso de querer saber a tragédia da vida alheia, mas a sincera abertura para sofrer o drama que bate a porta do outro.

Julguei, me indispus e tive má impressão de muitos, mas sempre que ouvi a história mais profunda das pessoas, não aquela contata nas rodas de festejo, acabei por ter compaixão. Quando se ouve a tragédia silenciosa de cada pessoa se entende seus descontroles cotidianos, seus exageros, sua arrogância, sua agressividade, sua tristeza crônica etc.

Cada vez mais que escuto, menos jugo, menos me indisponho. Confesso que existe, sempre, uma pitada de ressentimento com as falhas alheias (como pode?)… o ser humano é capaz de muita coisa quando se vê coagido, inseguro e desejando felicidade.

Ouvindo os erros, as insuficiências e as divisões internas de tantas pessoas, vou pouco a pouco reconciliando com as minhas próprias. Como um óleo refrescante caindo sobre a ferida, vou aceitando minha própria humanidade e vou desejando ser melhor, mas não do que os outros e sim do que a mim mesmo.

Os erros não cessam. É preciso mudar com os erros ao invés de se acabar esperando que os erros acabem.

Queira conhecer o humano e terá muitas surpresas (boas e más). O homem é um objeto indecifrável em seu todo. Depois de conhecer um pouco desejará ser ignorante de coisa tão assombrosa, mas  seguindo em frente perceberá que existe coisas belas por debaixo de tantos escombros.

É fácil visitar os salões dos outros, entrar naqueles lugares bem organizados e decorados da superficialidade humana, difícil é descer até os porões e ver de frente os rejeitos, o caos, os esquecimentos e os monstros que ali habitam.

Aqui escrevo nessa intuição: dizer que sou grato por fazer parte daquelas pessoas que operam na intimidade humana e ali perceber que as feiuras desse mundo nascem dessas vozes sufocadas e tão veemente recusadas, por um mundo que apenas se importa com grandezas artificiais.

As pessoas não são o que tentam fazer parecer ser, elas são o que são. Mas desde muito cedo aprendemos a criar um personagem que se mata para satisfazer a dura exigência alheia. Ser amado, pra muitos, é ter sucesso, dinheiro e poder (quem de nós não sofre dessa ilusão em algum momento e em alguma medida?). Descubro tão logo que é muito pobre quem cultivou apenas isso: empregabilidade, carreira, status, bens de consumo, relações de consumo.

Olho o cenário atual de nosso pais e o que se passou nos porões do poder e vejo isso: um mundo de areia que se desmorona.  O que daquilo tudo realmente vale a pena? A vida e sua fugacidade não é tão levada a sério.

Escutar pode curar. Escutar a dor real que assola as pessoas nos humaniza. Faz cair à máscara de sermos heróis que jamais fomos ou que jamais seremos.

Depois de tanto escutar a dor real perdi muitas vaidades. Sou “good”! Sou “good”? Eu diria não. Não faz sentido. Sou apenas um homem!

*O homem tão somente

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